quarta-feira, 10 de maio de 2017

Vitrinismo

“- Estava aqui pensando... Não te enoja saber que hoje em dia as pessoas se dão ao trabalho de serem descartáveis?
- Serem descartáveis? Pode me explicar melhor? – ele perguntou.
- Independente de como a pessoa se defina, me parece que de um modo genérico, cada vez mais as pessoas estão postas em vitrines, com seus perfis para serem compradas como mercadorias, superficiais, embaladas, montadas, para serem perfeitas para um exato momento e nada mais...”
Terminei com um “salvo raras exceções”. Ele não me respondeu mais. Habitualmente não me responde, e isso até não me surpreende. Não era sobre ele. Nem mesmo sobre uma situação que nunca chegou a nos acontecer. Era sobre aquilo que estava pensando por horas, e que apenas alguém como ele poderia entender. Pelo menos dentro da minha cabeça! Ele assim que nos conhecemos se despiu de seus pudores, e eu precisava entender seus enigmas e todas as palavras que raramente trocávamos.
Vitrinismo. A arte de arrumar vitrines. E que bela vitrine esse mundo se tornou!
E pensar que toda esta loucura surgiu ontem de tarde, quando resolvi mandar uma foto de uma poesia que estava lendo, chamada “Dor Oculta” de Guilherme de Almeida. E por sinal nem havia reparado em algumas coincidências tais como o nome do poeta, e essa dor oculta que ninguém enxerga. Então entre tantos Guilhermes, um me respondeu:
“ – Oi Vinicius, adorei o poema, Guilherme de Almeida o autor?
- Isto...
Sete horas depois:
- Como que você está? – ele perguntou.
- Estou bem e você?
- Não sei como estou – então ele riu – Está tudo bem mesmo?
- Tirando o fato de que parei de entender o ser humano, tudo numa boa sim... Não saber como está é bom ou ruim? – eu ri desconversando.
- Ser humano é uma arte, para ser bom ou ruim precisa de perspectiva.
- Uma arte bem abstrata e surreal – eu ri, não sabendo mais se ainda falávamos a mesma língua.
- Né? Eu estou lendo “A arte de amar”. Eu julguei o título do livro, mas é ótimo!
- Está aí um livro que queria ler e nunca li... – disse isso me referindo a ele e não ao livro.
- Recomendo.
- Depois de passar o meu vício por poesia eu vou ler! – desta vez me referi ao livro.
Ele riu e apenas respondeu:
- Está aí um ótimo vício!
- Um dos meus melhores...”
O outro é amar! E assim voltamos ao começo da história. O que estou pondo na minha vitrine?
               -Estava aqui pensando...

Dia 10 de Maio de 2017, Vicenzo Vitchella.

Nenhum comentário:

Postar um comentário