domingo, 14 de janeiro de 2018

Peito Nu

Começo pedindo desculpas, nunca fui bom assim com as palavras faladas e estava assustado com toda aquela situação. Alguém dizer para mim “Que belo peito em fogo!” “Queria comer você por completo”, minha intenção nunca foi ser um produto.
E ontem não bebi. Ontem parei e me encostei na parede, olhando para o céu que não estava lá. Então pensei: quem sou eu para reclamar! Não vi o dia e nem o céu do dia, e só era chuva por dentro.
Não lembrei de trocar a água das flores que eu tinha roubado, e em alguma parte morreu um punhado bem grande de mim junto delas. Trouxe-as para meu quarto e estou velando, enquanto tento inutilmente diminuir o barulho das teclas do computador do meu pai, porque de alguma forma acabei exterminando com o teclado do meu. Talvez é essa violência de vida que me faça bater tão forte nas letras, que tenha estragado tudo.
O anjo que eu fui, uma vez me disse:
- Que gauche, o que Vinicius. Ninguém usa essa palavra!
Mas o anjo não entendia nada de literatura brasileira.
Então não fui ser gauche na vida, e no meu caminho não havia nenhuma porcaria de uma pedra. Celebrei a simplicidade de um verso no meu universo todo ao contrário, patético e simplista. “Não diminua seu trabalho”, é o que diz a minha terapeuta. E lá vou eu mais uma vez falando porcarias sem vocabulário. A vida é pequena demais para celebrar minha desgraça. Então, que se dane...
Lá se vão as flores! Se as flores fossem cristãs iriam para o céu ou para o inferno? Vagamente me lembro das lições que um dia me deram, sobre o que é certo e errado para se fazer na vida. Que se dane... As flores escritas eram para o entretenimento, assim como eu também sou.
Peito nu. Não quero fazer o papel que me foi dado neste circo. Big-Bang-Bum. Tudo parado na avenida central, como num passe de mágica. Lentamente desfaço a minha postura rotineira, deixo a perna cair até o chão, escorregando pela parede. Vou até seus olhos parados com um eixo central de gravidade, e observo todas as cores que de longe eu nunca pude ver. São mais escuros do que eu pensava que fossem. Eu deixo tudo como eu queria, por um segundo de tempo todo meu.
As flores vermelhas acabaram com tons enegrecidos, também pudera, ainda estávamos brincando naquela noite cega. Meu peito nu e seu cabelo ao vento, mais um segundo de distração por dentro, me pego parado olhando para seu nada. Big-Bang-Bum, desfeita a magia. Não vejo o céu, você está de costas, alguém está bêbado do meu lado vomitando. A realidade? Que se dane, ela machuca...
Lá se vão as flores! E com elas de certo modo o anjo que me fez ser alguém dentro de um mapa. Introduzido pelos barulhos destas teclas malditas, neste buraco nojento. Eu grito: “Fechem as cortinas! Não quero ser o que não sou por mais nenhum momento. As flores que vão para o inferno”.
Peito nu. A nudez que ofende seus olhos. Sem contornos eu sou um borrão. Peito nu, uma nudez sem pudores, daquelas que vi no segundo de Bum dentro de seus olhos tão normais que me ofendem.
Termino pedindo desculpas, nunca fui bom com as palavras escritas e estou assustado com toda esta situação. Eu mesmo dizendo coisas que nunca fizeram sentido como “Que peito nu, cheio de flores!” e a minha intenção não era apenas ser um entretenimento barato, mas me consuma como um prato pronto de supermercado.
- Vai Vinicius, ser gauche na vida! – anjo maldito que não sabe nem o que é ser gauche. Cadê Drummond e aquela pedra? Seriam úteis na minha vida agora.

Dia 14 de Janeiro de 2018, Vinicius Osterer.