sábado, 28 de abril de 2018

Aqui Estou

Não sou um mártir. Aqui estou. Estou novamente acordando pelas tantas da tarde, depois de ficar quase um dia todo acordado, respirando, produzindo e vivendo a vida. Enchendo a cara, com a resseca derradeira de um sábado abafado, precipitando o Samhain e a Lua Rosa de Domingo. E não sei, porque talvez alguma coisa tenha mudado por tudo aqui fora e aqui dentro.
Acordei com minha sobrinha me dando três flores de vinca e dizendo:
- Para você colocar na sua roupa Tio Vini!
Obviamente ela anda reparando que seu tio vem colocando flores mortas e artificiais por toda parte. Vem cultuando um punhado de plástico agarrado sobre metais e produzidos em série, como os amores modernos ou as tragédias que estou colhendo nos livros de leitura obrigatória. E o que vou fazer com um punhado de flores roubadas?
Ontem fiquei uma hora sobre o sol quente, tentando fazer com que florescesse em mim algum punhado de cor que já tive. E sempre volto para a tríade, de alguma forma, com Cailleach, o terceiro signo astrológico, o céu em escorpião, minhas três xícaras de chá pela manhã. Aqui estou. Seria propício acreditar na regra dos três dentro da simbologia dos meus dias, criando novamente velhas manias de retratos mentais já mortos? Trilogias, triângulos mágicos, três capítulos...
Alguns dizendo que vivo uma história pesada. Não entendo qual é o peso, se ele não me enverga sobre as pernas. Não é como me sufocar de ar, mas encher o peito com tanta profundidade e discordar que não existem coincidências. Olho de tigre no peito, sabendo da aliança que ele representa.
Fluir em movimento retilíneo constante, abrir sobre o peito um buraco que expurgue para fora o punhado de material que já não presta, que já senti, já sinto, já acumulei por muito tempo.
Quem sabe ninguém nunca entenda o punhado de referencias que coloco numa poesia e em um texto. Ninguém precisa saber que no meu novo livro repleto de mitologia eu perdi o mito, criando diálogos imaginários que nunca tive e adaptando os que gostaria de ter tido para evitar um punhado de silêncios. Ninguém precisa saber qual é o terceiro signo, sobre o que é a trilogia, qual é a minha fórmula de derrota e fracasso. Ninguém precisa saber, porque ainda estou aqui. Ainda posso dizer o que quero, da maneira que quero, sem precisar explicações. E me perguntam o que tanto escondo. Não há nada escondido, está tudo aqui, de uma vírgula a um ponto de exclamação!
Andei perguntando para a Lua o que ela tinha para me dizer sobre isso. Parei para escutar a terra, enchendo meus pés de sabedoria. E sabe o que vou fazer com todo o meu amor? Não vou transformá-lo naquilo que mais desprezo, nem em amargura ou ressentimentos. Toda vez que desejar lhe bater com força, coloco uma semente em um vaso. Nas vezes que lembrar de todos os seus silêncios, coloco duas. Nos dias antes de dormir que pensar em como fui idiota, coloco três. Para cada mentira que você me contou, mais quatro. Depois disso, quando vier o Equinócio de Setembro, que me fez Senhor das Madrugadas, espero ter um punhado de vasos floridos das sementes que plantei. Quero reunir todos que amo, fazer um chá no gramado de baixo, e distribuir os mais variados tipos de cores e odores. Não posso machucar o mundo se fui machucado. E ainda espero que sejas muito feliz. Você não é uma sombra, é o processo.

Dia 28 de Abril de 2018, Vinicius Osterer.

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